quarta-feira, 20 de junho de 2018

Patton

Patton Trechos de Patton: O Herói Polêmico Da Segunda Guerra (2011), de João Fábio Bertonha.


Promovido a capitão em maio de 1917, [George S.] Patton fez o que pôde para ser incluído na primeira unidade que seguiria para a Europa. Para a sua sorte, o comandante dessa unidade (e de toda a Força Expedicionária Americana) seria o general John Pershing, com o qual mantinha um relacionamento estreito desde a experiência comum no México (e também pelo fato de o general estar flertando com a irmã de Patton naquele momento). Assim, não foi difícil para Patton conseguir ser incorporado à unidade de Pershing.

[...] os americanos chegaram ao território britânico e seguiram para Londres, onde foram festivamente recebidos pelos exaustos britânicos, e, em seguida, para a França.

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Com a esmagadora maioria das tropas ainda em seleção e treinamento nos EUA, oficiais como Patton tinham pouco a fazer. Na Europa, ele participava de eventos sociais, fazia visitas a tropas e oficiais britânicos e franceses, entre outras atividades distantes do calor da batalha. Pôde, entretanto, sentir o gosto da guerra moderna, ao ver aviões alemães bombardeando unidades aliadas e sendo recebidos por fogo de metralhadoras e canhões antiaéreos ou ao observar o efeito dos bombardeios de artilharia nos campos e nos soldados feridos.

Chateado por não poder agir imediatamente, Patton pensava em pedir transferência para outra unidade ou se tornar instrutor de baionetas. Foi nessa época que ele ouviu, pela primeira vez, a palavra "tanques", designação de uma nova arma que mudaria o curso da guerra no século XX e a carreira do jovem capitão.

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Num certo sentido, a Primeira Guerra Mundial representou, em termos militares, o encontro do velho e do novo. Ao mesmo tempo em que cavalos e mulas ainda formavam parte substancial do sistema logístico dos exércitos, transportando armas e suprimentos, a velha cavalaria revelou-se inútil. Pombos-correios ainda eram utilizados para as comunicações, ao mesmo tempo em que o rádio e o telégrafo também eram largamente empregados. Lança-chamas, minas e submarinos foram desenvolvidos e melhorados, mas ainda se confiava muito nos encouraçados e nos dirigíveis.

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Enquanto muitos generais acreditavam que os tanques só pudessem servir para facilitar a penetração da infantaria, por vias tradicionais, nas linhas inimigas ou, ainda, para abrir uma brecha a ser explorada pela cavalaria, Patton já antevia as possibilidades revolucionárias do novo armamento como forma de golpear decisivamente o inimigo em ataques profundos e mortíferos.

[...] num primeiro momento, o fator principal que o motivou a se transferir para o novo corpo, o dos blindados, foi a possibilidade de ascensão em termos de carreira militar numa arma totalmente nova, diferente da infantaria ou da artilharia.

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Já em novembro, ele se inscreveu no centro de treinamento em tanques leves do Exército francês em Compiègne. Lá, durante um curso de duas semanas, aprendeu o básico sobre as novas máquinas, dirigiu um modelo Renault e começou a compreender os mistérios e os desafios da nova arma. Em dezembro, visitou a fábrica da Renault em Paris, quando já foi capaz de fazer várias sugestões técnicas, as quais foram aceitas pelos franceses.

Na mesma época em que Patton estudava em Compiègne, o Exército britânico realizava o já mencionado ataque a Cambrai: 378 tanques Mark IV atacaram um setor da linha principal de defesa alemã, avançando, em poucas horas, quatro milhas, mais do que os ataques maciços de infantaria tinham conseguido em quatro meses. Mais da metade dos veículos foram perdidos nesse meio tempo e ficou claro como o seu uso tinha que ser aperfeiçoado. Contudo, o potencial da arma ficou demonstrado e num momento muito propício para Patton, que agora estava na posição de ser um dos criadores do corpo de tanques do Exército dos Estados Unidos.

[...] Porém, demorou para que fosse formado o primeiro batalhão, e apenas em junho surgiu um segundo, permitindo a criação de uma brigada, a 304ª.

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Em setembro, o corpo de tanques foi convocado para participar do ataque contra o saliente de Saint-Mihiel, um bolsão de 25 milhas de largura e 15 de profundidade nas linhas aliadas. Para o assalto, a brigada contava com 144 tanques Renault franceses. O Exército francês forneceu também dois grupos de tanques de apoio.

Em 12 de setembro, os tanques e a infantaria americanos atacaram as trincheiras alemãs, enfrentando tanto a resistência germânica como a chuva e a lama. Muitos quebraram ou ficaram impossibilitados de prosseguir por conta das dificuldades do terreno e da falta de combustível. Mesmo assim, o corpo blindado conseguiu, com poucas perdas, apoiar o avanço da infantaria.

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Poucos dias depois, a brigada de Patton recebeu ordens de apoiar a 28ª e a 35ª divisões do Primeiro Exército americano num ataque na região do Meuse-Argonne, contra a linha Hindenburg, defesa principal dos alemães na Frente Ocidental. Procurando resolver os problemas identificados no ataque anterior, ele fez com que seus tanques carregassem combustível extra e, seguindo a sugestão de um soldado, criou unidades de mecânicos que acompanhavam os blindados na linha de frente, providenciando reparos menores quando necessário e recolocando os tanques rapidamente em condição de combate.

Em 26 de setembro, o ataque foi lançado. Toda a participação de Patton, na verdade, não levou mais do que um dia. Às 5h30 da manhã, a infantaria havia marchado para frente em meio à neblina e fumaça. Uma hora depois, Patton e alguns soldados seguiram para a linha de frente e encontraram cinco de seus tanques parados, por serem incapazes de atravessar algumas trincheiras alemãs, bloqueadas por um tanque danificado. Sob pesada artilharia alemã, Patton, então, dirigiu as operações para superar esse obstáculo e logo os veículos subiram a colina, na direção dos alemães.

Animado, Patton liderou uma força de cerca de 150 homens na mesma direção, mas esta foi recebida por pesado fogo alemão. A maioria dos americanos recuou, mas Patton e alguns soldados seguiram em frente, sendo quase todos abatidos pelas metralhadoras germânicas, até que apenas o próprio Patton e o soldado Joseph T. Angelo restassem em pé.

Continuando a avançar, Patton foi atingido por uma bala que atravessou sua perna esquerda e parte do quadril. O soldado Angelo levou o tenente-coronel para um buraco e ficou com ele mais de uma hora, até que os tanques eliminaram as metralhadoras alemãs e Patton pôde ser removido para um hospital de campo. Lá, ele recebeu a notícia da sua promoção a coronel e, em pouco tempo, recuperou-se dos ferimentos.

Em 11 de novembro de 1918, o Armistício foi assinado e as armas pararam de atirar em todo o continente europeu. A 304ª havia lutado por quase dois meses.

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Enquanto esperava sua vez de voltar, Patton se preocupava com questões pessoais, como seu desejo de receber condecorações (como a Distinguished Service Medal, que foi concedida a ele em 4 de dezembro) e seu futuro em tempos de paz. Agora que a guerra havia terminado, o Exército haveria de ter, inevitavelmente, seu efetivo diminuído.

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Pouco depois da sua chegada aos EUA, Patton já demonstrava, em cartas e documentos pessoais, o quanto sentia falta da excitação do combate, do barulho das explosões e do ruído das metralhadoras. Para um homem que se sentia mais vivo do que nunca liderando soldados em combate e enfrentando a morte, nada poderia ser pior do que a paz. Ele ansiava por uma nova oportunidade de ser guerreiro.

Tal oportunidade, contudo, demoraria a chegar e, naquele momento, o que lhe restava era continuar sua carreira no Exército. Já no início dos anos 1920, conheceu outro jovem oficial cujo nome seria muito famoso nas décadas a seguir, o futuro comandante em chefe das Forças Aliadas na Europa e presidente dos EUA, o então coronel Dwight D. Einsenhower.

Os dois coronéis tinham muitas coisas em comum. Ambos voltaram ao grau de capitão em 1920, perdendo a promoção temporária da época da guerra. Ambos também apreciavam equitação e a prática do tiro e questionavam com severidade o sentimento antiguerra que varria os Estados Unidos naquele momento e que levava o Congresso a planejar intensos cortes no orçamento militar.

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A experiência dos tanques na Primeira Guerra Mundial havia indicado a imensa potencialidade deles, mas não a ponto de gerar uma adesão consensual de todos os militares à guerra blindada. Não espanta, na verdade, que a disputa entre defensores e opositores dos tanques e blindados como instrumentos de guerra ainda estivesse tão intensa, e não apenas nos Estados Unidos, naqueles anos. De fato, tendo entrado em ação apenas no final do conflito, com claras limitações técnicas e de doutrina e com resultados limitados, a arma blindada não podia se vangloriar de ter decidido a guerra ou de ter colaborado decisivamente para a derrota da Alemanha, como podiam fazer a infantaria ou a artilharia. Isso levou muitos oficiais a pensarem que os tanques eram algo superado ou secundário.

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Em 1922, Patton publicou um artigo no qual comentava as ações da cavalaria britânica na guerra do deserto em 1917 e 1918 e defendia o valor das cargas de cavalaria e dos sabres nos conflitos modernos.

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Patton acreditava que havia um excesso de confiança, no Exército, sobre as vantagens da mecanização. Patton tinha ojeriza à ideia de que as guerras eram vencidas pelas máquinas e pela superioridade tecnológica. Para ele, eram os homens e a força de vontade que levavam à vitória, e não os instrumentos. Seu raciocínio, em boa medida, se baseava na análise histórica e na premissa de que toda inovação tecnológica trazia, inevitavelmente, uma resposta, a qual anulava suas vantagens, permanecendo, como princípios decisivos da guerra, a coragem e a determinação.

[...] Além disso, Patton valorizava o Exército profissional em detrimento das grandes massas de recrutas. Acreditava no "espírito de luta" e no guerreiro enquanto profissional e não no simples "cidadão em armas". No seu trabalho de conclusão de curso apresentado ao Army War College em 1932, ele utilizou conhecimentos de história para argumentar que exércitos profissionais (como o macedônio ou o romano antigo) foram capazes de derrotar forças muito mais numerosas, mas pouco treinadas e motivadas, já que contavam com habilidade técnica e dedicação. Recordando o exemplo da guerra de 1914-1918, argumentou que ela tinha sido uma exceção, motivada pela criação de novas armas que tinham levado à paralisia nas trincheiras e à necessidade de mobilizar milhões de civis. Para ele, o próximo conflito voltaria ao padrão "normal" da história, com pequenos exércitos profissionais móveis.

Claro que, com o olhar de hoje, é fácil saber que Patton estava errado e que, menos de uma década depois, grandes exércitos de recrutas, com milhões de homens, se enfrentariam em campo. Patton, aliás, seria justamente o comandante de um desses exércitos. Mas, naquele momento, suas conclusões eram, em essência, um palpite ilustrado pelos seus conhecimentos de História Militar, e tão válidos como qualquer outro.


Mais:
http://docs.google.com/file/d/0BxwrrqPyqsnILTBBdmpCSjJudXM
http://en.wikipedia.org/wiki/Douglas_MacArthur#World_War_I
http://www.dailymotion.com/video/x3l0rk9