segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

Caixa reavaliada

Reler texto antigo (no caso, 'A caixa') é fogo. Voltei a matutar sobre o assunto lembrando-me dos comentários do vulgo com pretensões a não-vulgo relativos a essa caixa (a TV), os quais deixam-me pensando nela como um êmulo da de Pandora, dessa vez, via raios catódicos, atingindo-nos com estilhaços de sordidez e de vulgaridade. Tenho motivos para não aceitar essa visão limitada:

BEAKMAN’S WORLD - O Mundo De Beakman. Definitivamente, uma das produções de TV mais criativas de todos os tempos. É humorístico? É sobre noções de estudo de ciências? É metalingüístico (aqueles pingüins nada a ver com o resto)? De apresentadores, um cientista de jaleco verde-muco e com cabelão em forma de monólito, a garota ajudante e o rato gigante atrapalhante.

CHAVES & CHAPOLIN - El Chavo Del 8 & Chespirito. Roberto Bolaños e seus esquetes repletos de ingenuidade maliciosa. A cafonice e os precários efeitos especiais são referência até hoje. Seus bordões ficaram indelevelmente gravados no inconsciente coletivo que cresceu assistindo a essa dobradinha de séries, isso ocorrendo em seguidas gerações. Essa permanência, mais sua essência, para mim já é currículo suficiente para considerá-las relevantes. Reza uma conhecida anedota que Chapolin-Chaves é a segunda melhor coisa no México. A primeira seria a fronteira com os EUA. Desnecessário dizer que o Seu Madruga tornou-se um universo à parte.

I LOVE LUCY - Minha relação com a mãe das sitcoms é passional. Lucy, Ricky, Fred e Ethel são a alma do negócio. Caretas, gags geniais, vidinha suburbana e visual anos 50 em profusão. Lucy Ricardo é um dos 2 (e somente 2) personagens que eu gostaria de ter conhecido. O outro é meu avô paterno, que morreu em um acidente durante a construção de um açude em 1962. Tem quem ache possível não se apaixonar pela falsa ruiva pinel maior comedienne do século XX.

O INFELIZ - Sátira de Tom Cavalcante ao reality show O Aprendiz, versão à brasileira do americano The Apprentice. Besteirol altamente esculachado como há tempos eu não via/ria na programação nacional.

PERNALONGA, PICA-PAU - Bugs Bunny, Woody Woodpecker. A gratuidade de quase todos os trotes violentos aplicados em antagonistas. Rolos compressores de momentos antológicos ("Que é que há, velhinho?", "Balancê pelo salão...", "100 mil dólares, mulheres...", "E lá vamos nós!", "Em todos esses anos nessa indústria vital...", "Eu disse siga a motoca!", as versões de óperas). O certeiro clima de burla sempre mantido por uma eficiente trilha sonora orquestrada, em que não faltam tubas, fagotes, trombones, oboés, trompetes, xilofones. A dublagem em português como um intuitivo exercício de gênio. O registro de épocas.

SESSÃO ESPIRITUAL DO DESCARREGO - Igreja Universal do Reino de Deus S/A a serviço da piada involuntária. Trata de exorcismos espetacularizados. É transmitida esporadicamente em horários perdidos na madrugada. Vale pelo clima misto de freak show com estelionato.

SOUTH PARK - Pérola da incorreção e do humor negro. Nessa cidade, modelo da jequice made in USA, tudo é visto pela lente do exagero, da escatologia, do nonsense, do grotesco e do mau gosto premeditado, com insistente apelo ao baixo-ventre. Em seus episódios, abordam diversos temas (terrorismo, troca de MP3, cinema, células-tronco, clonagem, racismo, pedofilia, religião, política), sempre da maneira mais esculhambada e ofensiva possível. É tal a virulência das sátiras e o desfile de idéias insanas e desagradáveis, que me espanto com a popularidade que esses toscos e sacanas bonequinhos de cartolina alcançaram. Possui períodos de entressafra, com episódios ruinzinhos.

THE SIMPSONS - Desenho notável pela longevidade e criatividade - esta última um tanto declinante nas temporadas mais recentes. Seus criadores chegaram a cogitar o encerramento das atividades, alegando desgaste. Tendo como eixo o American way of life, encarnado na família-título, como seu filhote e concorrente South Park, é outro que nos dá a impressão de "já ter falado sobre tudo". É um desses produtos da indústria do entretenimento em massa que causam excepcional admiração por sua inteligência sem pedantismo e esmero na elaboração.

THE TWILIGHT ZONE - Seriado cujo nome foi traduzido por aqui como Além Da Imaginação. O supremo clássico em preto e branco perpetrado por Rod Serling e seu exército de ótimos roteiristas. Sem personagens fixos, com temáticas de suspense, ficção científica, noir, passando até por faroeste. Fortemente embasado no conceito de "viagem para dentro".  Twist endings para o espectador pular espantado no sofá. Com seu emblemático tema musical composto por Bernard Herrmann, é uma verdadeira obra-prima da televisão mundial. Existem remakes.

THE X-FILES - Arquivo X. Uma dupla de agentes do FBI (homem e mulher) envolvida em entrechos complexos cheios de aliens, mutantes e teorias conspiratórias. Sua grande sacada era dar verossimilhança às situações mais absurdas e insólitas, além de excelentes cenas de ação. Lá pelas derradeiras temporadas, e com a saída do ator David Duchovny, o agente Fox Mulder, digo que o material perdeu fôlego e passou a contar com episódios pouco inspirados. Tenho reservas quanto a esse segmento final.

TOPA TUDO POR DINHEIRO - Apesar da atual má fase do SBT, Seu Silva e alguns de seus projetos já viveram, sim, dias melhores. Nesse, confesso que achava fraquíssima a parte de palco, a qual, invariavelmente, consistia de brincadeiras com artistas (na falta de termo adequado) que estavam em evidência na época, tipo sertanejos, pagodeiros, axezeiros. Para mim, marcante mesmo era o famigerado quadro da câmera escondida, com pegadinhas como a antológica É um, pa pa pa… (realizada no calçadão de uma praia aqui em Fortaleza). Havia também as véias fantasiadas do auditório, que eram de uma tosqueira inusitada e autêntica, pelancudas dançando e rodando em ritmo de festa ou digladiando-se pelos aviõezinhos de cédulas graúdas.

ZOOM - Programa interessante dedicado a curta-metragens do Brasil e, eventualmente, de outros países. É cria da prima pobre TV Cultura. Há eras que não o vejo; não sei se ainda é exibido.

segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

Algo de novo no front

Está aí o recente - suposto? pretenso? - arrastão em grande escala no Centro, o qual foi desexplicado pelas autoridades (in)competentes seguindo a tática Barbrady de "não tem nada pra ver aqui", tangendo com o quepe os curiosos. Não me agradam hipóteses conspiratórias. Mas já que resido numa província que está em um país onde Severino Cavalcanti é levado a sério, prefiro ficar com uma pata atrás e considerar várias conjecturas. Vem comigo.

Então, espiem só. Alguma coisa acontece, e não é perto do meu marcapasso. Ou as lombras de crack deixando os malacos mais selvagens e exacerbando o desprezo deles pelas mais elementares regras de etiqueta, ou os bairros pacificados que existem apenas em propagandas oficiais com imagem cinematográfica e reluzentes camburões, ou a violência latente de cada protótipo de cidadão comum, ou simplesmente a população crescendo demais numa área que não segura a onda de tanta gente querendo sobreviver (há um nome vistoso para isso: infra-estrutura; nesse caso, a falta dela).

A suspeita de fluidos a cheirar mal rolando nos bastidores, tal qual água no canal do Jardim América, eu já vinha costurando faz é tempo, numa colcha feita retalhos de conversas aqui e acolá, ouvidas de colegas ou de incógnitos. Tornando-se amiudados (mera coincidência?) causos envolvendoseqüestros-relâmpago, refregas entre bandido e polícia, coronhadas, trombadinhas em fuga derrubando velhotas, horários e locais cada vez menos recomendáveis.

Tenho uma teoria dos precedentes. Se alguém, antes de 11 de setembro de 2001, viesse com especulações sobre o que rolou naquela terça-feira, certamente receberia respostas tipo "Ah, fala sério!", "Não viaja, impossível!", "Isso é coisa de filme!". Até que um bando de labregos maometanos foi lá e fez. Aquilo foi o precedente. Agora tínhamos a prova de que a audácia mirabolante era possível. Virou parte da paisagem morar assustado imaginando onde seria o próximo. E depois ainda houve outros golpes em Londres e em Madri. Os incidentes que ora brotam cá pela cidade, por enquanto comentados com um mix de espanto/indignação/excitação, podem, perigosamente, representar o precedente de fatos que os cabeça-chata pósteros vão encarar em seu cotidiano como sendo tão banais quanto mulheres seminuas nas propagandas das traseiras de ônibus ou topics superlotadas às 6 da tarde.