sábado, 30 de agosto de 2008

Quem escreve

- Quer convencer-me de que os seus livros não se parecem consigo?
- Oh, claro que sim, absolutamente nada!
- Se alguém afirmasse que o reconhecia nos seus livros, o que lhe diria?
- Oh! Não me reconhecem nada, reconhecem... o tanas. Não me reconhecem absolutamente nada!

(extraído daqui)

Dêem uma brechada de leve nessa massamorda irrequieta. Escritores, jornalistas, satiristas, panfletários, colunistas, blogueiros, com suas inseparáveis e surradas palavras mágicas tais como denunciar, protestar, polemizar, soltar o verbo, cutucar a ferida e todo esse papo de contracapa de livro do Jorge Amado. Por mais legítimas e válidas que pareçam suas opiniões, por que acreditar que eles (ou eu) vivam num mundo à parte daquilo que tanto criticam? Ou que não tenham algum aspecto réprobo diverso daqueles pelos quais eles conquistaram fama e sucesso ao desancar? Pode ser um pecado pensar mal dos outros, mas raramente será um erro. E eu gostaria muito de ter inventado essa frase, porém ela é do piadista H.L. Mencken. E antes isso que fabricar pelas esquinas heróis pretensamente 100% probos, idôneos e com palavreado e postura acima de qualquer crítica.

Pelo menos para mim, reles amador, escrita não passa de um exercício de: observação, imaginação, estilo, ortografia, vocabulário e gramática. Todos os meus movimentos são friamente calculados. O leitor que levar a sério demais quem escreve e as idéias subjacentes aos rabiscos, será por sua conta e risco. Risadas quando enceno mentalmente o encontro do incauto fã com seu autor favorito. "Cara, me identifico com tuas obras, tá ligado? Tira uma foto comigo!" Choveriam especulações a respeito do objeto de tamanha tietagem. Deve tratar-se de um iluminado auscultador do comportamento humano e árbitro de costumes, no estilo ermitão no alto da torre com uma luneta, a recolher a matéria-prima de seus belos textos e que raramente se mistura aos meros mortais. Mas que nada, talvez seja apenas o Arnaldo Jabor ou mais um do clã Gasparetto.

E haja grita - via editorial, redação do colégio, seção de cartas, blog - contra a ganância das grandes corporações, o aquecimento global, a febre consumista, a futilidade das novas gerações, a insensibilidade das elites, a TV alienadora, a falta de leitura. Aí me lembro é do Jotapê Traste, ops, Sartre, e seu "o inferno são os outros". Porque é brincadeira de playground estar sempre disposto a apontar, com o dedo sujo de ranho, a cota de enxofre das vizinhanças. E ainda faturar e$crevendo sobre. Dificílimo, no território do utópico, é cada um detectar em si porções do reino do tinhoso.

Falando nisso, reparem só naqueles dois sujeitos. Um desmascarou uma rede de pedofilia em que tubarões da elite paulistana foram punidos; ele protagoniza uma coluna de jornal na qual faz duras diatribes à sociedade em geral; ele é um molestador de crianças. E o do lado, criou uma vacina que salvou vidas (by âncora de telejornal) no norte do país e publica poemas de temática pacifista em seu site pessoal; ele espanca a esposa freqüentemente. E eu, que apontei para essa dupla com o indicador sedento de cagüetagem? A-ha! Sintam-se à vontade para descobrir podres meus também. Divirtam-se. Apesar do teto de vidro não-blindado.

sábado, 23 de agosto de 2008

Olympia

Entre causos envolvendo 1 vara perdida, 1 sova argentina e n chororôs, minha vez de falar de Olimpíadas. Ou quase isso.


Vejamos o diferenciado regime Fu Manchu de pavio curto em vigência no país dos amarelos anfitriões da versão 2008, herança vermelha dos anos passados sob o tacão do papa-uh-Mao-Mao. É um baita nicho de mercado para os aspirantes a Bono Vox. Protestos bacaninhas, manifestos, abaixo-assinados, atitudes engajadas e produtos semelhantes. Made in China.


Esses dias, dei uma oportuna reassistida no filme Olympia, partes 1 e 2, da Leni Riefenstahl. É um documentário sobre essa grande gincana periódica, a do longínquo e logo ali 1936, realizada na Alemanha. Ou seja, numa nação a lamber os coturnos do homenzinho do bigode abominoso & sua grife, o nacional-socialismo.


A bonita seqüência dos saltos em câmera lenta no trampolim da piscina evoca força e cadência dignas de obra do conterrâneo Richard Wagner. Leni era uma apaixonada por: estética, técnica e harmonia (a do corpo humano, notadamente). Para explorar os temas que tanto estimava, ela pegou carona em um rebotalho como o nazismo. Com naturalidade e despudor. E que são ainda mais evidentes n'O Triunfo Da Vontade. O fascínio pelo mal. O belo que brota do mal. A obsessão por um ideal de juventude & beleza, a mesma que amaldiçoou o angustiado Dorian Gray.


No assim chamado mundo real, em território chinês, não há closes memoráveis nos fuzilamentos, nem tomadas antológicas nas perseguições a desafetos políticos, nem música triste do John Williams (ganhadora de Oscar) como trilha sonora de pessoas humilhadas pela censura. Adolfo e seus áulicos foram devidamente escorraçados do trono já faz tempo. Os tiranetes burocratas de olhos puxados permanecem por lá. Festanças prodigalizando jogos e gentileza postiça são todo o verniz com o qual líderes mesquinhos adoram pintar seus brinquedinhos de governar, o cetim para ataviar suas repúblicas impopulares, pouco importa o local ou a época.


Arrefecida a atlética euforia e terminado o evento, o urso panda pergunta: E o bambu?

domingo, 17 de agosto de 2008

ARJ & outras velharias

Jornaleco noticiando o fechamento de uma tradicional loja de CDs aqui da cidade. Suspiros de ai-como-era-grande pipocando cá e acolá no texto, insípidos e repetitivos como ruínas em um ermo vistas através de janela de trem em movimento.

Que nostalgia é um negócio lucrativo, quase todo mundo sabe. Basta ver as festas temáticas anos 80 por aí. E vestirei a carapuça de idiota da objetividade. Acho que comigo o mecanismo de acionar saudade não funciona corretamente. Exceto por uns poucos conhecidos que ficaram para trás, tropeçando na tal da morte. Esse buzinaço sobre épocas pretéritas, inclusive as em que os saudosistas nem eram nascidos, não é do meu feitio. Retrocedamos 12 anos. Como características minhas naquela fase, mencionaria cabelos relativamente compridos, futeenlidade, irritabilidade e gosto por rock pesado. Árdua tarefa celebrar sem restrições um período em que eu era viciado em MTV e rabiscava desenhos do Spawn no caderno do colégio.

Não adianta. Por mais que o turbilhão de momentos idos empolgue multidões com vinhetas televisivas e jingles, penteados beehive, biquínis de bolinha amarelinha, serenatas na madrugada, estúdios Vera Cruz, bailes animados pelo conjunto que mandava brasa ao tocar Perfidia, o prazer de ouvir a agulha no LP ou o tac-tac da máquina de escrever, pôsteres do galã Marlon Brando e da bela Rita Hayworth, o comercial da Policar, cantigas Popeye Foi À Feira e Lagarta Pintada, fotógrafos lambe-lambe, casamento na delegacia, marchinhas de carnaval, Lili Marleen, We Are The World, luzes de discoteca, manual Chernoviz de medicina popular, Woodstock, carrões rabo-de-peixe, pin-ups, filme dos Goonies e mIRC, minhas recordações dão prioridade é a: crises econômicas, esperanças abortadas depois de aberturas políticas, acesso precário à internet discada, vestuário cafona, telefones celulares de 12 centímetros e meio quilo pendurados nas cinturas, dificuldade em encontrar boas fontes de informação, companhia de gente errada, TV aberta sendo a principal opção de lazer, páginas impressas sofrivelmente por uma matricial, digitar um monte de comandos ao usar o ARJ.

ARJ? Precisei dele para copiar o infame e divertido game Duke Nukem 3D para meu velho computador Pentium 100 MHz. Foi um périplo transferi-lo do PC de um colega para lá. Apelei ao compactador chamado ARJ, o qual operava com diretivas tipo ARJ A -VA -R A:... via prompt do DOS. Terminada a 1ª etapa do traslado, saí entoando vivas ao prodígio da tecnologia, que permitia guardar 36 MB em, salvo engano, 13 disquetes de 1.44 MB. Em casa, teclaria outro comando chato e longo, e torceria para que não houvesse erros de leitura, CRC e marmotas que tais durante a descompactação, senão lascava tudo. Hoje, parece-me arcaico e ritualístico, algo semelhante ao que deveriam sentir os que deram voltas em uma manivela para acordar o motor de um Ford modelo T ou desentranharam a fita do K7 presa nas engrenagens do aparelho de som.

Penso que meu problema seja a memória seletiva. Nos viúvos do calendário, ela peneira o que é considerado bom e eleva ao quadrado. No meu caso, porém, vem à tona primeiro o que havia de pior. E aí já viram, não é?

Mas até que me saio bem nos fortuitos encontros - às vezes, indesejáveis - com figurantes do nosso passado. Vizinhos da rua antiga ou freqüentadores da mesma escola. Nada que uma falsidadezinha não resolva. É quando surgem os manjados "Tem notícias do Esopo?" e "Lembra-se da Ariadne?" e o fatal "Bons tempos aqueles, né?". "Não, não eram!" - para não dizer isso, faço um esforço hercúleo análogo ao de certos espectadores de shows de comédia stand-up, e que consiste em dar humanitários risinhos forçados e amarelos no intuito de não constranger o inepto aspirante a Seinfeld no palco.

"I've said it before and I'll say it again: Life moves pretty fast. If you don't stop and look around once in a while, you could miss it." (Ferris Bueller)

domingo, 10 de agosto de 2008

Com que roupa

Se virem uma dessas:
 
perguntem a quem veste o título de uma música stoneana que não seja (I Can't Get No) Satisfaction e surpreendam-se com a resposta.

Se virem uma dessas:
 
perguntem a quem veste em que país surgiu o AC/DC e surpreendam-se com a resposta.

Se virem uma dessas:
 
perguntem a quem veste em que região de nosso planeta fica a Jamaica e surpreendam-se com a resposta.

Se virem uma dessas:
 
basta saber que quem veste comprou-a no Iguatemi com o cartão de crédito Visa do papai.

Se virem uma dessas:
 
perguntem a quem veste o que significa a sigla THC e surpreendam-se com a resposta.

Se virem uma dessas:
 
perguntem a quem veste como se diz "desajustado" em inglês e surpreendam-se com a resposta.

Se virem uma dessas:
 
perguntem a quem veste se conheceu Shiva (supondo que saiba quem é) através de um livro ou de uma rave e surpreendam-se com a resposta.

Se virem uma dessas:
  
perguntem a quem veste em que país nasceu Ernesto Guevara (supondo que saiba quem é) e surpreendam-se com a resposta.

Se virem uma dessas:

  
perguntem a quem veste se sabe o significado de palavras como "opróbrio", "iníquo" e "anatematizado" e surpreendam-se com a resposta.

Se virem uma dessas:
 

ou a variante:
 
é melhor nem perguntar.

Se virem uma dessas:
 
perguntem a quem veste se sabe o que é sexo hetero e divertido e surpreendam-se (ou não) com a resposta.

Se virem uma dessas:
 
perguntem a quem veste se sabe o que é sexo hetero e divertido e surpreendam-se (ou não) com a resposta. [2]

quarta-feira, 6 de agosto de 2008

Preacher

No último texto, usei - não em vão - o nome do Duke de Bagaça e Bourbon.

Se existe uma homenagem inusitada ao hombre é na HQ Preacher. Mas antes deixem-me falar da série, que é excelente. Os que já leram algo do Garth Ennis verão novamente o insano e eficiente desfile de seus temas mais queridos: profusão de personagens insólitos, situações bizarras/escatológicas, diálogos ótimos e sarcásticos, humor nigérrimo, violência em doses não-homeopáticas, a boa e velha ponte aérea Nova York-Texas (eventualmente, outras plagas), além de um misticismo alopradamente fora do convencional. O protagonista, o "pregador" do título, Jesse Custer tem como conselheiro e amigo imaginário simplesmente Marion Morrison, o primevo e único.

De jeito nenhum vou me arriscar a fazer qualquer tipo de sinopse dessa saga maluquete. Ela também circula aí pela internet afora, em forma de scans. Quem tiver curiosidade...

Entre a infância e a adolescência,eu acompanhava com bastante freqüência as publicações mensais com super-heróis Marvel e DC e sua luta pela justiça no combate aos malfeitores. Mas como o tempo passa o tempo voa e até a Poupança Bamerindus foi para o brejo, perdi o interesse por esse tipo de ficção. Não faço idéia do que ocorre no mundo dos quadrinhos atualmente.

sábado, 2 de agosto de 2008

A cura

Olá, caros irmãos e irmãs. A seguir, uma mensagem especial para vocês.

É, para vocês aí, que têm comportamentos tão desagradáveis e contrários às leis do bem-viver. Vocês místicos do psy trance, vegans, ufólogos, talibans antitabagistas, árdegos defensores dos povos da floresta, histéricos de passeata de diversidade sexual, os que não gostam d'Os Trapalhões fase anos 70 ou de Leslie Nielsen, os crentes que distribuem folhetos de porta em porta no domingo de manhã, os que fazem viagens em busca do sentido da vida, proprietários de F-1000 com paredão de som (e, conseqüentemente, CDs de forró), blogueiras semi-alfabetizadas com grave carência afetiva e fãs de Sexo & A Cidade, chavistas, obamistas, ahmadinejadistas, protetores dos fracos e oprimidos, dos frascos e dos comprimidos, adolescentes com nariz de palhaço em shows de bandas wannabe-cult, velhotes que tingem o cabelo de acaju, os que têm tatuagem homenageando banda de axé, baladeiros com depressões periódicas, solteironas de mal com o mundo, sonhadores dai gualdade ampla-geral-irrestrita, balzaquianas que escrevem em miguxês, os que dão mais atenção a placas de vídeo GeForce que às namoradas, freqüentadores-template dos cinemas do Espaço Unibanco do Dragão do Mar, os que rabiscam suásticas e/ou cruzes invertidas nos cadernos do colégio, usuários de camisetas com "Aspira" ou "Pede Pra Sair" escrito no peito, andróginos do campus do Benfica com síndrome de supercool, patricinhas revô que curtem Hello Kitty ou Miley Cyrus e fogem de casa, sindicalistas preguentos com sovaqueira crônica, metaleiros tr00 ou f@ke, rappers de classe média-alta (de qualquer classe, melhor dizendo), quarentões roucos e barrigudos que votam em Moroni Torgan, citadores compulsivos de frases literárias, escritores/cineastas famosos por lição de vida/repúdio à guerra/ode ao amor livre em suas obras, fãs de jornalistas e/ou MPBzeiros perscrutadores da alma feminina, ávidos consumidores de livros psicografados, multiculturalistas, ambientalistas, cientologistas, abortistas, wiccas, blasés, indies, junkies, grunges, britpopeiros, moicanos de shopping, otakus e RPGzeiros virgens, assinantes de Carta Capital/Caros Amigos/Raça Brasil, concurseiros, efeminados/machonas/ateus/anarcos/micareteiros/whatever caricatos e militantes, admiradores do chic à Clodovil Hernandes, ripongos, góticos com maquiagem de corvo, adeptos da dieta dos fótons, padres cantores, poetas concretistas, duplas sertanejas de Goiás, recifenses que publicam manifestos, metrossexuais, mulheres espia-só-como-sou-moderna, antropólogos com doutorado exaltadores de baile funk, os que adoram falar em "humor sofisticado" e/ou "semiótica" e/ou "reeducar serial killers", os arriados os 4 pneus e o estepe pelo Coringa versão Heath Ledger, se vocês querem parar de sofrer agora e abandonar definitivamente suas rotinas de pecado, ofereço a cura. Vou dizer algo que provavelmente vocês já ouviram, mas devem ter feito ouvido de mercador:

“Só John Wayne salva e liberta.”

Quem não crê já está condenado.