domingo, 9 de novembro de 2014

Tanga

A atuação das tropas de Paul von Lettow-Vorbeck, na África Oriental, contra as forças britânicas, em Tanga [3 a 5 de novembro de 1914], durante a Primeira Guerra Mundial.

Uma testemunha ocular descreve vivamente a batalha: "Ao amanhecer, Tighe atacou Tanga com o 13º Rajputs e o 61º de Pioneiros. Na orla de Tanga, Tighe encontrou um entrincheiramento fortemente defendido pelo inimigo. Pouco depois, ele foi atacado e repelido, seus homens cedendo em desordem. Nenhum ato heroico, por parte dos oficiais britânicos, serviu de alguma coisa. Os oficiais eram alvejados um após o outro ao tentarem reunir os homens e deter a debandada. Tivemos cerca de 300 baixas hoje e nossos homens se comportaram vergonhosamente, não mostrando em momento algum coragem militar. Nunca tive muita confiança em nossas medíocres tropas indianas. Os oficiais britânicos comportaram-se como heróis, mas nenhum deles teve qualquer chance, com seus homens fugindo como coelhos e matraqueando como macacos. Ao anoitecer, tínhamos mais dois batalhões em terra, e o restante desembarcaria na manhã seguinte. Nenhum canhão, nem sapadores serão desembarcados, o que é uma pena, pois eles estão com todos os nossos explosivos e granadas. Como é fácil esquecer aquele importante axioma militar: 'A superioridade da força no ponto decisivo.'"

Arthur Aitken [comandante da força de ataque britânica] sentiu então que os Rajputs e os Exploradores não eram de confiança. Todas as tropas, exceto os artilheiros e os sapadores, desembarcariam o mais breve possível nas praias B e C. Não se deu ordem para fazer o reconhecimento. Na verdade, nesse momento Tanga já havia sido abandonada pelos FK germânicos. O comandante alemão foi mais ativo que seu equivalente adversário e pessoalmente fez o reconhecimento de Tanga em bicicleta. Ele também compreendia o valor da artilharia e em suas memórias lamenta muito a ausência de seus canhões, que teriam sido aniquiladores a tão curta distância. Baseado na experiência pessoal adquirida no leste asiático, Lettow-Vorbeck achava que as tropas britânicas foram lançadas à batalha inabilmente e tinha certeza que, numa região fechada e desconhecida como Tanga, seus problemas seriam enormes.

Aitken decidiu avançar a 4 de novembro, numa frente ampla bastante para flanquear os alemães. A direção do avanço seria mantida pelo 2º Regimento Real do Norte de Lancashire (os Loyals), com os outros batalhões, indianos, de confiabilidade menor, metidos entre os melhores. Avançando pelo mato cerrado, pelas densas plantações de seringueiras e sisal e ao calor intenso do dia, os batalhões não podiam se deslocar com a mesma rapidez sem a perda de contato, de modo que houve extravios inevitáveis e o esperado movimento de instrução tornou-se numa turba incontrolável.

Os dois batalhões da Caxemira lograram algum progresso na investida contra Tanga, mas na extrema esquerda o 101º de Granadeiros, apesar do denodo com que se bateu, foi obrigado a recuar. O contra-ataque alemão se desenvolvia contra o flanco esquerdo britânico, que estava aberto; é que Lettow-Vorbeck compreendera que estava, ao sul, aquém do ponto atingido pela ala direita de suas tropas, e, quando os soldados começaram a recuar, o pânico foi provocado por carregadores que, sendo alvejados, abandonaram suas cargas e correram para as praias. Eles foram confundidos com askaris alemães, e este foi o sinal para os medíocres regimentos correrem para as praias. Lettow-Vorbeck insistiu no contra-ataque e o assalto britânico ruiu por terra.

Lettow-Vorbeck descreve assim a fase final da batalha: "O rumo da ação vinha mostrando que a frente inimiga, cujo flanco estava desprotegido, não havia conseguido, ao sul, atingir o ponto alcançado pela ala direita de nossas tropas. Ali, portanto, o nosso contra-ataque mostrar-se-ia aniquilador e nenhuma testemunha esquecerá o momento em que as metralhadoras da 13ª Companhia abriram um fogo contínuo nesse ponto e inverteram por completo a situação. Em louca desordem, o inimigo fugiu, e nossas metralhadoras, convergindo sobre a frente e os flancos do adversário, ceifaram companhias inteiras."

A maioria dos regimentos usados tinha pouco ou nenhum treinamento para as condições nas quais teriam que lutar e nem sequer estavam familiarizados com suas armas ou com seus comandantes. A experiência, em guerra no cerrado, da força expedicionária, era nula e, mesmo assim, ignorara-se a oferta de uma força de cobertura do experimentado KAR (King Afrikan Rifles). Os oficiais britânicos ainda resistiam ao uso de tropas africanas, que eram, realmente os únicos soldados capazes de tolerar as severas condições climáticas da área.

O serviço de inteligência, indispensável ao sucesso das operações militares, não existia na força britânica. O Estado-Maior ignorava a disposição das linhas alemãs e nada conheciam da costa onde se daria o desembarque. O comandante fora advertido de que os alemães, usando a ferrovia, podiam mandar tropas para Tanga em trinta horas, mas ainda assim os soldados foram informados de que não encontrariam qualquer resistência. Aliás, o Governador Belfield achava que a coleta de informações só era necessária "numa emergência". A conduta de uma guerra mundial não estava nessa categoria.

Vale a pena sumariar os fatores importantes que contribuíram para a derrota britânica na Batalha de Tanga. Em resumo, os princípios básicos da guerra haviam sido ignorados. A inexistência do elemento surpresa, a ausência de Inteligência, o fato de não ser feito um reconhecimento e a falta de cooperação entre marinha e exército, tudo isso combinado com a baixa qualidade das tropas, haviam transformado a Batalha de Tanga numa derrota decisiva para os britânicos antes mesmo que começasse.


Fonte:
http://www.grandesguerras.com.br/artigos/text01.php?art_id=36

Mais:
http://caminhosdamemoria.wordpress.com/2009/02/06/o-junker-invencivel-paul-von-lettow-vorbeck
http://timashby.com/the-german-general-who-told-hitler-to-go-screw-himself
http://www.youtube.com/playlist?list=PLrWPsj6fVbeVVzUgCFMZqgJFoLbWlRsJe