domingo, 2 de abril de 2017

Minha luta

Trechos de Minha Luta (1925), de Adolf Hitler.


Já desde o tempo em que eu vivia em Viena pairava sobre os Balcãs aquela atmosfera pesada, prenúncio de tempestade, e já lampejos mais claros riscavam o céu, mas se perdiam ligeiros nas trevas sinistras. Em seguida, veio a guerra dos Balcãs, e, com ela, o primeiro temporal varreu a Europa, já agora nervosa. A tempestade desencadeou-se, e, aos trovões do céu, juntavam-se as baterias da guerra mundial.

Quando a notícia do assassinato do grão-duque Franz Ferdinand chegou a Munique, eu estava justamente em casa e ouvia contar o desenrolar dos acontecimentos de maneira muito vaga. Logo depois, ouvi o nome dos autores presumíveis e verifiquei que eram sérvios, fiquei estupefato ante essa vingança do destino impenetrável. O maior amigo da raça eslava caíra sob as balas de fanáticos eslavos.

É uma injustiça fazer hoje em dia recriminações ao governo de Viena sobre a forma e o conteúdo do seu "Ultimatum". Nenhuma outra potência do mundo teria agido de maneira diferente, se se encontrasse em idênticas condições.

A verdade é que mais outra tentativa para manter a paz teria trazido a guerra numa época ainda menos propícia.

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Graças a Deus, a luta do ano de 1914 não foi, na realidade, imposta e sim desejada pelo povo.

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A 3 de agosto apresentei um requerimento a S. M. o rei Ludwig III, no qual eu solicitava a permissão para assentar praça num regimento bávaro. A secretaria do Governo, naquela ocasião, como era natural, estava assoberbada de serviço. Por isso tanto mais alegre fiquei ao tomar conhecimento, já no dia seguinte, do despacho favorável à minha solicitação. Ao abrir, com mãos trêmulas, o documento no qual li o deferimento do meu pedido, com a recomendação de me apresentar a um regimento bávaro, meu contentamento e minha gratidão não tiveram limites. Poucos dias depois, eu envergava a farda, que só quase seis anos mais tarde deveria despir.

Comparado com a luta titânica que se travava, todo o passado desaparecia inteiramente.

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Em seguida, veio uma noite úmida e fria em Flandres, durante a qual marchamos silenciosos e, quando o sol começou a despontar através das nuvens, rompeu de repente sobre as nossas cabeças uma saudação de aço, e, entre as nossas fileiras, sibilavam balas que caíam levantando a terra molhada. Antes de desaparecer a pequena nuvem, duzentas bocas gritavam ao mesmo tempo "urra" a esses primeiros mensageiros da morte. Em seguida, começou o pipocar da metralha, a gritaria, o estrondo da artilharia, e, febricitante de entusiasmo, cada um marchava para a frente, cada vez mais depressa, até que, sobre os campos de beterraba, e, através das charnecas, começou a luta corpo a corpo. De longe, porém, chegavam aos nosso ouvidos os sons de uma canção, que, cada vez mais se aproximava, passando, de companhia a companhia, e, enquanto a morte dizimava as nossas fileiras, a canção chegava a nós e nós a passávamos adiante: "Deutschland, Deutschland, über alles, über alles in der Welt!"

Passados quatro dias, voltamos. Até a maneira de andar dos soldados se tinha modificado. Rapazes de dezessete anos pareciam homens feitos. Os voluntários do regimento de List talvez não tivessem aprendido bem a lutar, o que é certo é que sabiam morrer como velhos soldados.

Esse foi o começo. Assim continuou a luta, ano a ano. Ao romantismo das batalhas tinha sucedido o horror. O entusiasmo se arrefecera aos poucos e o júbilo transbordante foi abafado pelo pavor da morte. Chegou a época em que cada um tinha de lutar entre o instinto de conservação e o imperativo do dever. Também eu não escapei a essa luta. Cada vez que a morte rondava, algo indeterminado procurava se revoltar, baseado na razão, e, entretanto, isso nada mais era do que a covardia que, assim disfarçada, procurava envolver cada um. Já no inverno de 1915 a 1916 eu tinha decidido essa luta. Só agora o destino podia caminhar para as últimas provas, sem que os meus nervos se rompessem ou a minha razão falhasse.

O jovem voluntário tinha se transformado num soldado experimentado. Essa transformação tinha se operado no exército inteiro. As lutas constantes o tinham envelhecido e, ao mesmo tempo, enrijado. Os que não puderam resistir à tempestade foram por ela vencidos. Somente agora é que se poderia julgar esse exército. Só agora depois de dois a três anos em que uma batalha se seguia a outra, em que ele combatera contra inimigos superiores em número e em armas, sofrendo fome e necessidades, só agora é que se podia avaliar o valor desse exército, único no mundo.

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Logo após as primeiras notícias de vitórias, uma certa imprensa começou a deixar cair sobre o entusiasmo geral algumas gotas de entorpecente, e isso devagar e desapercebidamente para muitos. Agia, essa mesma imprensa, sob a máscara de boa vontade, de boas intenções e até mesmo de zelo pela sorte do soldado. Receava-se um excesso no festejar das vitórias.

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A propaganda [de guerra], entretanto, não foi criada para fornecer a esses senhores blasés uma distração interessante e sim para convencer a massa.

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Lá [na Inglaterra], a propaganda valia como arma de primeira ordem, enquanto que entre nós era considerada o último ganha-pão dos políticos desocupados, e fornecia pequenas ocupações para heróis modestos.

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A propaganda inimiga tinha começado entre nós, no ano de 1915; desde 1916 tornou-se cada vez mais intensa, para finalmente se transformar, no começo de 1918, numa onda avassaladora. Podia-se, então, a cada passo, reconhecer os efeitos desta conquista de almas. O exército alemão aprendia aos poucos a pensar conforme o inimigo desejava.

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Que aconteceu em França quando, em 1914, de vitória em vitória, varríamos o solo francês? Que fez a Itália nos dias da derrocada de seu front de Isonzo? Que fez a França na primavera de 1918, quando o ataque das divisões alemãs parecia abalar as suas posições nos seus fundamentos e quando as baterias de longo alcance começaram a fazer sentir os seus efeitos em Paris? Como lá se soube tirar partido da paixão nacional levada ao paroxismo, lançada em rosto aos regimentos em retirada desabalada! Como trabalhou a propaganda em influenciar a massa, no sentido de inculcar a fé na vitória final no coração dos soldados dos fronts rompidos!

Que aconteceu entre nós? Nada. Ou pior do que isso. Naquela ocasião subiam-me à cabeça a raiva e a indignação quando, ao ler os jornais, tinha de analisar, sob o ponto de vista psicológico, aquela matança em massa. Senti, pela primeira vez, nesses meses, a maldade da sorte que me mantinha no front, ao alcance do tiro de qualquer negro, enquanto, no seio da Pátria, eu poderia prestar serviços mais eficientes. Já naquela ocasião, tinha bastante confiança em mim mesmo para acreditar que teria levado a cabo tal empresa. Eu não passava, porém, de um desconhecido, um entre oito milhões! Assim sendo, o melhor era calar a boca e tratar de cumprir, na posição em que estava, o meu dever, da melhor maneira.

No verão de 1915, caíram em nossas mãos os primeiros boletins inimigos. Seu conteúdo era quase sempre o mesmo, se bem que com algumas variantes na forma da exposição. Todos afirmavam que a miséria na Alemanha aumentaria cada vez mais; que a duração da guerra seria infinita, que as probabilidades de vitória seriam cada vez menores, que o povo em casa cada vez mais desejava a paz, que só o "militarismo" e o "Kaiser" queriam a continuação da guerra; que o mundo inteiro - que bem sabia disso - não fazia a guerra ao povo alemão e sim exclusivamente ao único culpado que era o Kaiser, que a luta não teria fim antes do afastamento desse inimigo da humanidade pacífica; que as nações liberais e democráticas aceitariam a Alemanha, uma vez acabada a guerra, na liga eterna da paz mundial, aceitação essa que seria garantida, desde o momento em que estivesse aniquilado o "militarismo prussiano", etc., etc.

Em fins de setembro de 1916, a minha divisão se deslocou para a batalha do Somme. Essa foi para nós a primeira das formidáveis batalhas materiais que se seguiram, e a impressão, difícil de descrever, era mais de inferno do que de guerra. Semanas a fio, sob o furacão do fogo de barragem resistia o front alemão, às vezes comprimido um pouco para trás, às vezes avançando de novo, porém nunca recuando.

A 7 de outubro de 1916 fui ferido. Consegui ser levado para a retaguarda e deveria voltar para a Alemanha em um trem de ambulância. Haviam-se passado dois anos desde a última vez que eu vira a Pátria, período de tempo quase infinito em tais circunstâncias.

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Logo que pude andar de novo, consegui licença para ir a Berlim. A miséria áspera, mais negra, era visível por toda parte. A cidade de milhões estava faminta. O descontentamento era grande.

Muito pior era, porém, a situação em Munique. Quando me restabeleci e tive alta do hospital e fui transferido para o batalhão de reserva, pensei não reconhecer mais a cidade. Descontentamento, desânimo, imprecações por toda a parte. Mesmo no batalhão de reserva, o moral era abaixo da crítica.

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Lá para os fins do ano de 1917, parecia ter atingido o máximo o desânimo no exército. O exército inteiro, após o colapso russo, estava animado de nova esperança e de nova coragem. A tropa começava cada vez mais a se convencer de que a luta haveria de acabar com a vitória da Alemanha. Ouvia-se novamente cantar, e os agourentos cada vez eram mais raros. Tinha-se de novo fé no destino da Pátria.

Sobretudo o colapso italiano, no outono de 1917, tinha produzido um efeito maravilhoso. O inimigo estava visivelmente abatido. Nesse inverno houve mais calma do que de costume; era a calma que precede a tempestade.

Justamente enquanto o front fazia os últimos preparativos para o final da luta, enquanto transportes de homens e material rolavam para as linhas do oeste e a tropa recebia instruções para o grande ataque, arrebentou na Alemanha a maior patifaria de toda a guerra.

A Alemanha não deveria vencer. À última hora, quando a vitória começava a se decidir pelas bandeiras alemãs, lançou-se mão de um meio que parecia adequado a sufocar, de um golpe, no nascedouro, a ofensiva alemã da primavera, tornando a vitória impossível.

Organizou-se a greve de munições. Caso ela vingasse, o front alemão teria de se esfacelar e seria realizado o desejo, manifestado pelo "Vorwärts", de que a vitória desta vez não fosse das cores alemãs. A linha da frente teria de ser rompida em poucas semanas, por falta de munição.

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Até então, os nossos soldados eram vistos como loucos a quem uma derrota certa esperava. Agora, porém, estava diante deles o destruidor do aliado russo.

Desde os dias de setembro de 1914, quando, pela primeira vez, começaram a rolar para a Alemanha, pelas ruas e estradas, os magotes infinitos dos prisioneiros russos da batalha de Tannenberg, a avalanche parecia não ter fim. Entretanto, cada exército batido e destruído era substituído por um novo. O Império colossal fornecia ao Czar cada vez novos soldados e à guerra suas novas vítimas e isso inesgotavelmente. Quanto tempo poderia a Alemanha resistir a essa corrida?

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A imaginação era trabalhada pelas sombras das montanhas do sul do Tirol. Até na névoa de Flandres se projetavam as fisionomias sombrias dos exércitos batidos de Cadorna, e a fé na vitória cedia o lugar ao medo da próxima derrota.

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Os jornais ingleses, franceses e americanos começaram a semear essa convicção no coração de seus leitores, enquanto uma propaganda imensamente hábil era utilizada com o fim de elevar o moral das tropas. "A Alemanha às vésperas da revolução! A vitória dos aliados inevitável!" Este foi o melhor remédio para pôr o indeciso Tommy e o Poilu de novo firmes sobre as pernas. Podiam agora fazer funcionar de novo os fuzis e metralhadoras e, no lugar de uma fuga em pânico, estabeleceu-se resistência cheia de esperanças.

Foi esse o resultado da greve das munições. Ela reavivou entre os povos inimigos a fé na vitória e pôs termo à paralisante depressão no front aliado. Em consequência disso, milhares de soldados alemães tiveram que pagar com seu sangue esse desatino. Os promotores desse mais que infame golpe eram aqueles que esperavam obter os mais elevados postos administrativos na Alemanha revolucionária.

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Em julho de 1917, pisamos, pela segunda vez, o solo tão sagrado para nós todos, pois nele repousavam nossos melhores camaradas que, quase ainda crianças, tinham se lançado à morte, de olhos fixos na Pátria querida! Nós, os velhos, que outrora ali passamos com nosso regimento, quedávamo-nos respeitosamente comovidos diante desse lugar sagrado, onde tínhamos jurado "fidelidade e obediência até à morte". Esse terreno, três anos atrás tomado de assalto pelo nosso regimento, tinha agora de ser ocupado numa tremenda batalha defensiva.

O Inglês preparava a grande ofensiva de Flandres com um fogo de barragem que já durava três semanas. Parecia então que o espírito dos mortos revivia; o regimento se agarrava com unhas e dentes à lama imunda, apegava-se aos buracos e às fendas do solo, sem se abalar nem ceder um palmo, e ia se tornando, como já uma vez, cada vez mais desfalcado, até que, finalmente a 31 de julho de 1917, desencadeou-se o ataque dos ingleses.

Nos primeiros dias de agosto fomos substituídos. O regimento tinha se transformado em algumas companhias; estas marchavam para a retaguarda, recobertas de lama, mais se assemelhando a espectros do que a criaturas. Fora algumas centenas de metros de buracos de granadas, o Inglês só tinha conseguido encontrar a morte.

Agora no outono de 1918, estávamos, pela terceira vez, no terreno da ofensiva de 1914. A nossa cidadezinha, Comines, outrora tão sossegada, tinha se transformado em campo de batalha. É verdade que, embora o terreno da luta fosse o mesmo, as criaturas tinham mudado: fazia-se agora política entre a tropa. O veneno da Pátria começou, como em toda parte, a trazer até aqui os seus efeitos. Os reforços mais novos falharam inteiramente - eles tinham vindo da Pátria já contaminados.

Na noite de 13 a 14 de outubro, começou o bombardeio a gás na frente sul de Ypres. Empregava-se um gás cujo efeito ignorávamos ainda. Nessa mesma noite, eu iria conhecê-lo por experiência própria. Estávamos ainda numa colina ao sul de Werwick, na noite de 13 de outubro, quando caímos sobre um fogo de granadas que já durava horas e que se prolongou pela noite adentro, de maneira mais ou menos violenta. Lá por volta de meia-noite, já uma parte de nossos companheiros tinha sido posta fora de combate, alguns para sempre. Pela manhã senti também uma dor que de 15 em 15 minutos se tornava mais aguda e, às 7 horas da manhã, trôpego e tonto, com os olhos ardendo, eu me retirava levando comigo a minha última mensagem da guerra.

Já algumas horas mais tarde, os meus olhos tinham se transformado em carvão incandescente. Em torno de mim tudo estava escuro. Foi assim que eu vim para o hospital de Pasewalk na Pomerânia e ali tive de assistir à revolução!

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Tudo tinha sido em vão. Em vão todos os sacrifícios e privações, e em vão a fome e a sede de meses sem fim. Em vão as horas em que, transidos de pavor, cumpríamos assim mesmo o nosso dever, e em vão a morte de dois milhões que então caíram.

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Seguiram-se dias terríveis e noites mais terríveis ainda. Eu sabia que tudo estava perdido. Contar com a misericórdia do inimigo era loucura. Nessas noites cresceu em mim o ódio contra os responsáveis por esses acontecimentos. Nos dias que se seguiram tive a consciência do meu destino.

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Eu, porém, resolvi tornar-me político.


Mais:
http://docs.google.com/file/d/0BxwrrqPyqsnIZWZ5YjQyTWZYV00
http://docs.google.com/file/d/0BxwrrqPyqsnIUVN1cXdGYUxxelU
http://www.30giorni.it/articoli_id_5415_l6.htm