Outro dia, andando de Mercedes-Benz com motorista - era um ônibus -, presenciei o seguinte diálogo:
- Pocotó, posso fazer uma brincadeira de pergunta e resposta contigo?
- Manda lá, Chicletinho, macho véi!
- Como é que a gente chama uma pessoa que não tem perna?
- Perneta!
- Muito bem! E uma que não tem mão?
- Maneta!
- E uma que não tem punho?
- Eita! Aí é fuleiragem sua!
O que provocou rústicas e sinceras risadas em alguns passageiros. Chicletinho e Pocotó eram palhaços devidamente paramentados e pintados, que estavam em missão das mais sisudas. Iam em coletivos vendendo cartões com mensagens brega-líricas ao preço de 1 Real ou um vale-transporte, para arrecadar recursos para a manutenção de um projeto que levava atrações circenses e farsas pueris para crianças vítimas de AIDS e de câncer em hospitais. Chamava-se Terapia do Riso, diziam. Surgiu em minha mente sem ordem nem sentido, um turbilhão de binômios paradoxais. Palhaços/doentes terminais, sorrisos/ríctos, piada/quimioterapia, infância/morte, cambalhotas/agonias, maquiagem espalhafatosa/rostos cadavéricos, cócegas/AZT, peruca colorida/queda de cabelo, bicicleta/radioterapia, feijão da mãe cozinhando/cheiro de éter e de amoníaco, tropeço de patins/infecção hospitalar, casa da vó/UTI, sorvete de chocolate/injeção nada indolor.
Há tempos, só de gaiatice, batizei um tipo de fenômeno com o neologismo "marróia". Quando a dupla de bufões artistas do subemprego, para arrancar uma verba, explicasse o porquê de estar ali, alguém exclamaria "Mas olha!" (que em cearensês pronuncia-se marróia). Certa vez, abestadamente contribuí com um cara desse ramo de negócios. Ainda tenho o cartão, pois fiz dele marcador de páginas. Isso me lembra de algo. Todo sábado, das 19:00h às 21:00h, tiro a máscara cotidiana, ponho outra, hospitalar, e atuo como voluntário no Hospital Infantil do Câncer Albert Sabin. Marróia. A classe média desocupada ataca novamente.
E como é chato ver a dona da Bunda do Momento doando microscópica fração do gordo cachê do seu ensaio na Playboy para uma associação beneficente. Sob uma horda de trêmulos microfones e ávidas câmeras, beijando cabeças calvas de frágeis e debilitados pequenos seres. Um desinfetante de eucalipto escondido na bolsinha. Faz parte do show business. Subir os degraus da fama montada na cacunda de uma massa infanto-cancerosa. É mais um cata-audiência.
Mas esqueçamos essa lengalenga tétrica, pseudo-filosófica e inútil. Até aqui, tudo não passou de uma digressão. O que eu queria falar mesmo, a idéia principal de hoje é que andar de ônibus pode ser estranhamente divertido. Cuidado com a linha 052 (Grande Circular 2), que ocorre muito assalto nela.
- Pocotó, posso fazer uma brincadeira de pergunta e resposta contigo?
- Manda lá, Chicletinho, macho véi!
- Como é que a gente chama uma pessoa que não tem perna?
- Perneta!
- Muito bem! E uma que não tem mão?
- Maneta!
- E uma que não tem punho?
- Eita! Aí é fuleiragem sua!
O que provocou rústicas e sinceras risadas em alguns passageiros. Chicletinho e Pocotó eram palhaços devidamente paramentados e pintados, que estavam em missão das mais sisudas. Iam em coletivos vendendo cartões com mensagens brega-líricas ao preço de 1 Real ou um vale-transporte, para arrecadar recursos para a manutenção de um projeto que levava atrações circenses e farsas pueris para crianças vítimas de AIDS e de câncer em hospitais. Chamava-se Terapia do Riso, diziam. Surgiu em minha mente sem ordem nem sentido, um turbilhão de binômios paradoxais. Palhaços/doentes terminais, sorrisos/ríctos, piada/quimioterapia, infância/morte, cambalhotas/agonias, maquiagem espalhafatosa/rostos cadavéricos, cócegas/AZT, peruca colorida/queda de cabelo, bicicleta/radioterapia, feijão da mãe cozinhando/cheiro de éter e de amoníaco, tropeço de patins/infecção hospitalar, casa da vó/UTI, sorvete de chocolate/injeção nada indolor.
Há tempos, só de gaiatice, batizei um tipo de fenômeno com o neologismo "marróia". Quando a dupla de bufões artistas do subemprego, para arrancar uma verba, explicasse o porquê de estar ali, alguém exclamaria "Mas olha!" (que em cearensês pronuncia-se marróia). Certa vez, abestadamente contribuí com um cara desse ramo de negócios. Ainda tenho o cartão, pois fiz dele marcador de páginas. Isso me lembra de algo. Todo sábado, das 19:00h às 21:00h, tiro a máscara cotidiana, ponho outra, hospitalar, e atuo como voluntário no Hospital Infantil do Câncer Albert Sabin. Marróia. A classe média desocupada ataca novamente.
E como é chato ver a dona da Bunda do Momento doando microscópica fração do gordo cachê do seu ensaio na Playboy para uma associação beneficente. Sob uma horda de trêmulos microfones e ávidas câmeras, beijando cabeças calvas de frágeis e debilitados pequenos seres. Um desinfetante de eucalipto escondido na bolsinha. Faz parte do show business. Subir os degraus da fama montada na cacunda de uma massa infanto-cancerosa. É mais um cata-audiência.
Mas esqueçamos essa lengalenga tétrica, pseudo-filosófica e inútil. Até aqui, tudo não passou de uma digressão. O que eu queria falar mesmo, a idéia principal de hoje é que andar de ônibus pode ser estranhamente divertido. Cuidado com a linha 052 (Grande Circular 2), que ocorre muito assalto nela.