domingo, 12 de outubro de 2014

Bloqueio

O Almirantado discutia a estratégia a ser empregada contra a poderosa Frota do Alto-Mar alemã sediada na parte sul do mar do Norte e contra os esquadrões de cruzadores que a Marinha alemã estacionara no estrangeiro - especialmente no Mediterrâneo e no Pacífico.

O bloqueio observacional foi abandonado um mês antes da deflagração da guerra. Em seu lugar adotou-se o "bloqueio a distância", planejado para controlar as saídas do mar do norte. Isto era possível devido à posição geográfica das ilhas Britânicas, colocadas como um quebra-mar entre as passagens que conduzem dos portos alemães e bases navais no Báltico e no mar do Norte aos oceanos. O plano britânico determinava que a frota do canal estacionada principalmente nos portos do estuário do Tâmisa, em Dover e Portsmouth, fechasse o canal da Mancha, enquanto a muito mais poderosa Grande Esquadra ficaria sediada em Scapa Flow, nos Orkneys e colocaria no mar uma linha de cruzadores ou navios mercantes armados (chamada patrulha do Norte) para vigiar as águas distantes e tormentosas entre as ilhas Shetlands, a Noruega e a Islândia. Tal era, em breve resumo, o plano de bloqueio naval que foi levado a cabo em agosto de 1914.

O Almirantado esperava que a resposta do inimigo ao bloqueio britânico tomasse a forma de um ataque ao comércio marítimo, como nas guerras anteriores, usando cruzadores e navios mercantes armados. Este era um tipo de guerra naval perfeitamente legal, sujeito às regras incorporadas pela convenção de Haia no que diz respeito à segurança das tripulações dos navios mercantes capturados. E de fato os atacantes alemães de superfície mostraram humanidade na observância dessas regras. Antes da guerra o Comitê Imperial de Defesa examinara as medidas necessárias para manter o tráfico [tráfego] marítimo em andamento, apesar das possibilidades de captura. A Convenção determinou que o Estado deveria receber 80% dos prêmios necessários para cobrir os riscos de guerra dos navios mercantes e responsabilizar-se por 80% das perdas. Contudo, de início, o Tesouro não estava disposto a aceitar tal intrusão no campo da iniciativa privada e o esquema de Seguro dos Riscos da Guerra não entrou em vigor até o início da guerra.

A 20 de novembro de 1914 um pequeno navio mercante britânico foi afundado por um submarino alemão no mar do Norte e a tripulação foi deixada em botes - o que era contrário à convenção de Haia. Outros afundamentos por submarinos vieram em seguida. Isso introduziu um elemento inteiramente novo no ataque alemão ao comércio - para o qual a Marinha Real estava completamente despreparada. As implicações deste fato foram muito sérias. No dia 11 de março de 1915, o governo britânico emitiu uma Ordem ao Conselho, normalmente conhecida como "Ordem para Represálias", já que fora emitida "em represália" ao uso ilegal dos submarinos. Declarava que os bens destinados à Alemanha poderiam ser apreendidos, mesmo que estivessem sendo conduzidos para um porto neutro.

Os países neutros e especialmente os Estados Unidos protestaram, considerando o gesto uma interferência com o que consideravam um comércio legítimo e sem dúvida altamente lucrativo. Os Estados Unidos nunca modificaram sua posição de que a Ordem para Represálias era ilegal - até sua entrada na guerra. Mas a razão verdadeira para a ordem era que o governo britânico sabia que os países escandinavos e a Holanda estavam importando quantidades muito maiores de bens da lista de contrabando britânica do que faziam antes da guerra. Obviamente o excesso estava sendo passado para a Alemanha. Desse modo, os serviços de transporte marítimo estavam substituindo a frota mercante alemã, a esta altura imobilizada. As falhas de bloqueio através da Itália nunca foram sérias e, quando ela entrou na guerra ao lado dos aliados, em maio de 1915, desapareceram completamente. O mesmo não acontecia com a Holanda e os países escandinavos, que conseguiam passar grande quantidade de mercadorias. Não foi fácil interromper este tráfico.

As dificuldades com os países neutros tornaram-se agudas. Os navios interceptados ficavam sujeitos a longos atrasos e algumas vezes eram afundados enquanto navios britânicos os conduziam para inspeção. Depois da guerra o governo britânico pagou o valor total das mercadorias mais 5% de juros por todos os navios afundados nessas circunstâncias. O governo britânico tinha que agir com moderação e cautela, devido às susceptibilidades dos países neutros. Isso se aplicava muito especialmente aos Estados Unidos, onde os grupos de pressão contrários aos britânicos eram poderosos e barulhentos.

A resposta alemã ao endurecimento do bloqueio britânico consistiu em declarar todas as águas em volta das ilhas Britânicas, a partir de 4 de fevereiro de 1915, "zona de guerra". Qualquer navio poderia ser afundado nessa zona, sem qualquer aviso prévio. Começou então a campanha submarina sem restrições. Ela durou até agosto, quando o aumento dos protestos dos países neutros levou o governo alemão a ordenar o retorno a métodos menos flagrantemente ilegais.

O bloqueio comercial da Alemanha ganhou em importância a partir do impasse na frente ocidental.

Os britânicos demonstraram grande talento nas pressões que exerceram para reprimir essas atividades. Era possível à Grã-Bretanha privar os navios de carvão e outros suprimentos essenciais, já que os depósitos de carvão em muitos portos estrangeiros eram controlados pelos britânicos. O fato da maior parte dos negócios bancários e de seguro estar situada em Londres permitia recusar crédito e seguro às firmas que não estivessem acima de suspeitas. O controle britânico sobre a maioria das comunicações mundiais por telégrafo e cabo submarino tornou improvável que negócios com a Alemanha e seus aliados pudessem ser ocultados por muito tempo. E, por fim, se um navio partisse com uma carga ilícita, o Almirantado seria chamado para interceptá-lo. Se a marinha britânica conseguisse alcançá-lo, quase certamente sua carga seria apreendida.

Mas o Ministério do Bloqueio não trabalhou apenas para impedir o embarque de carregamentos para o inimigo. As importações das nações neutras foram racionadas com severidade crescente, de modo a não ultrapassarem os totais anteriores à guerra. Bens que eram particularmente vitais ao esforço de guerra inimigo, tais como minerais especiais (tungstênio, por exemplo) usados na manufatura de armas e chapas blindadas, foram controlados através da compra preventiva de todo o estoque disponível.

Certamente os alemães não aceitaram de braços cruzados a escalada das medidas aliadas com relação ao bloqueio e em março de 1916 eles recomeçaram a campanha submarina sem restrições.

Embora suas Forças Armadas ainda não tivessem sofrido demasiadamente, já que tinham a prioridade para todos os suprimentos disponíveis, as condições da população civil estavam começando a se deteriorar seriamente. As colheitas tinham sido más em 1915 e 1916, especialmente devido à falta de fertilizantes importados. Os territórios conquistados na Europa Oriental não tinham conseguido substituir os suprimentos vindos do além-mar. Os produtores domésticos de alimentos estavam retendo sua produção ou vendendo-a no mercado negro. O valor calórico da ração civil vinha caindo constantemente e a escassez de roupa tornava-se cada vez mais aguda. Com a aproximação do inverno de 1917 - que seria lembrado na Alemanha como o "Inverno do Nabo" - as perspectivas pareciam extremamente sombrias.


Fonte:
http://www.grandesguerras.com.br/artigos/text01.php?art_id=147