sábado, 27 de setembro de 2008

Tenho uma camiseta regata com a frase "Garotas, vacinem-se contra a virgindade aqui"

Eu sou o Coringa, o palhaço, o Joker. Trecho do clássico-mor da redublagem, o vídeo Bátima - Feira Da Fruta. Confesso que ri. E, na verdade, não tenho uma camiseta regata com a frase "Garotas, vacinem-se contra a virgindade aqui" plus seta descendente apontando para o jimmy. Foi só para fazer enxame. Falando em Batman (em Robin, mais precisamente), dia desses, estava eu visitando páginas do Radiguet, que era o menino-prodígio das letras francesas. Numa de suas divagações, entre baforadas de Gauloises, o infante terrível (ao lado da trindade Shirley Temple, Super Vicky & Pastorinha Louca, uma das grandes influências da Maísa do SBT) comenta o quão era ridículo em seus contemporâneos o pavor de... Cair no ridículo.

No hábito de reler meus textos antigos, deparo-me com reproduções ipsis litteris daquelas piadinhas que são repassadas por e-mail. Logo adiante, tropeço em trocadalhos do carilho que são genuínos representantes da tradição Arnaldo Antunes & Humberto Jéssica. E há também o mundo além da internet. Minha rústica barbicha de 3 dias, minha coleção de MP3 do Bartô Galeno e do Genival Santos, meu celular invariavelmente sem créditos, meus pés abrigados em havaianas com temática surfista; carregando - em meus passeios de volta da mercearia - um pão sovado no formato de uma parábola de concavidade para baixo. É quando a observação do francesinho desaba em minha cabeça cearense como uma bigorna de desenho da Warner Bros.

Mas não exatamente me envergonho desses posts com jeitão de vocalista do Chiclete com Banana, desses escritos que ostentam mullet, óculos Ambervision e pochete. Tampouco do meu cotidiano Vida Leva Eu. E é questão secundária se isso me põe no mesmo balaio dos pangarés que têm "Mulheres do topo da árvore" ou "Filtro Solar" no quem sou eu do Orkut - e ainda participam da comunidade 'Amo as coisas simples da vida' -, do metrossexual falando alto, ao Nokia, de pomadas cicatrizantes, dos pivetes de bermuda caída e cueca à mostra ouvindo new metal no MP4 et caterva. Melhor é pensar que isso cria um belo apartheid entre mim e aquele outro pessoal Ibiza Prada Audi, bastante asseado e 0% de germes & bactérias, cheirando a cânfora e com aparência de comercial de sabão em pó, certinho e superior, estola de raposa e tamanco de fivela, suíte presidencial, nenhuma peça fora do lugar, aspirante a Napoleão de Ingres ou a capa da Vogue, tô-por-dentro-de-tudo, exalando bom gosto, simetria, harmonia e dandismo de novo-rico admirador da dupla Chiquinho Scarpa e Roberto Justus. Beau Brummell do Parque Manibura, Coco Chanel do Beco dos Pintos. São os fidalgos portadores da síndrome de dona-de-casa gorda com mania de limpeza.

A nível de Brasil, então, a situação é tétrica. Tão decadente que chega a passar raspando em chaminés dos círculos de maior profundidade do inferno. E aí, os que se consideram um tiquinho acima da multidão bovinácea ao seu redor (e às vezes nem isso, são apenas megalomaníacos) já se acham gênios renascentistas incompreendidos no meio de uma nação transbordante de brutos descendentes do Paulinho Paiakan.

Será o pódio do ridículo esse afã de eliminar pela raiz nossas ridicularias? Perguntas retóricas são ridículas? Sim. Essa obsessão - em muitos casos, ineficaz - por parecer sempre sofisticado/refinado praticamente torna-se análoga à tentativa de ser chique povoando de toalhinhas as prateleiras de geladeira. A sofreguidão em fugir d'A Gafe pode ornar uma personalidade tanto quanto uma ruma de guaranás Dolly em uma mesa de festa de aniversário. Militantes de patrulhas tolerância zero anti-ridículo cheios de pose e bebendo Perrier e escarnecendo o mórbido desfile de acochadas calças verde-limão pelas ruas do Centro podem ser tão embaraçosos e, ahn, sim, ridículos quanto título de pornochanchada, discurso de Miss Universo e a bandeira da Paraíba. Assemelham-se a despreparadas tropas de paz da ONU que provocassem chacinas indiscriminadas.

E algo que há tempos deveria ter caído para a 2ª divisão do campeonato das sutilezas ou recebido um carimbo de "perspicaz pero no mucho" da Vigilância Sanitária: querer erradicar até o derradeiro aspecto vil da condição humana é tarefa de Sísifo. Ou, numa abordagem mais Carlos Massa: serviço de corno.